Marianna De Franco Gomes
Maria Cândida Trindade Costa de Seabra
A Toponímia, entendida como o conjunto dos nomes de lugar, tem a função de denominar, referenciar e distinguir um espaço geográfico concreto. Ao receber um nome próprio, um local se individualiza, destacando-se de outros, tornando-se um ponto de referência espacial importante para o homem que dele se utiliza.
O nome próprio de lugar costuma interessar às pessoas em geral que procuram, através desse signo linguístico, decifrar a motivação que levou o denominador à escolha do nome. A Toponímia, nesse caso, volta-se para o estudo da origem e do significado dos nomes.
Contribuindo com os estudos Toponomásticos, no ano de 2017, apresentou-se a 1ª edição da obra Toponímia Histórica de Minas Gerais, do Setecentos ao Oitocentos Joanino – Registros em Mapas da Capitania e das Comarcas, resultado de pesquisas interdisciplinares que culminou em um Repositório de Dados, cujo conteúdo muito tem contribuído com os estudos históricos, destacando-se como fonte segura de informações de tempos pretéritos. São informações que se fazem necessárias, sobretudo, quando o pesquisador precisa:
a) observar se um topônimo se mantém em uma mesma forma;
b) comprovar a existência de um topônimo em épocas passadas;
c) conhecer ou comprovar a presença de nomes antigos dos lugares;
d) conhecer a motivação toponímica;
e) conhecer a origem dos nomes, não o seu étimo;
f) localizar topônimos em mapas antigos.
g) conhecer referências de localização, históricas e atuais, dos topônimos.
h) identificar o status político-administrativo e eclesiástico dos topônimos históricos.
i) identificar circunscrições territoriais político- administrativas e de planejamento atuais, referentes aos topônimos históricos.
j) estabelecer correspondências entre nomes antigos e atuais.
Desde o lançamento do Repositório, cinco anos já se passaram, período em que se deu seguimento à pesquisa, com revisões e atualizações de dados que são apresentados nesta 2ª edição. Em destaque:
1) Como o banco de dados em estudo armazena topônimos históricos, há que se evidenciar a distância temporal entre o período em que ocorreu o ato de nomeação e o período atual, quando é realizada a análise toponímica. Justifica-se, desse modo, a presença de mais de uma motivação proposta para alguns topônimos, como exemplos, citam-se:
- Aiuruoca, registrado nos mapas históricos utilizados neste estudo como Juruoca ~ Jeruoca ~ Iaruoca ~ Jaruoca. Na primeira edição deste Repositório de Dados esse topônimo foi classificado como ecotopônimo[i], porém, a revisão do material consultado para a realização da pesquisa suscitou o questionamento sobre o principal fator motivacional que esse topônimo compreende, uma vez que faz referência, também, a um penhasco muito alto, conforme apresenta Barbosa (1995, p. 20), sobre o topônimo em questão: “ninho ou toca ou casa de papagaios, aludindo a um penhasco redondo e elevado aos ares, sobre um dos mais altos montes daquele lugar, em que os papagaios faziam morada”. Nesse caso, justificaria a classificação como geomorfotopônimo[ii]
- Perdões, classificado, inicialmente, como animotopônimo[iii], em um estudo mais aprofundado, permite-se a classificação, também, como hierotopônimo[iv], tendo em vista que o nome antigo da localidade S.r Bom Jesus de Perdões teve como motivação aspectos religiosos.
- Campo Bello, classificado na 1ª edição como geomorfotopônimo, aceita, também, a classificação como fitotopônimo[v], já que o termo “campo” é polissêmico e compreende diferentes fatores físicos, tanto relacionados à topografia do relevo, quanto à botânica. Tratam-se de fatores, portanto, que estão associados em uma mesma paisagem e, juntos, caracterizam um campo.
2) A revisão do material de pesquisa permitiu corrigir algumas inadequações no banco de dados, tais como o topônimo Toledo, classificado, anteriormente, do ponto de vista, sincrônico contemporâneo, como corotopônimo[vi]. A classificação mais adequada, em uma visão diacrônica, é antropotopônimo[vii] porque se refere a Simão de Toledo Piza que foi quem, primeiramente, minerou a região[viii] e, portanto, motivou a nomeação do local.
3) Destaca-se, ainda, nesta nova edição, a ampliação da análise, tendo em vista a contribuição e expansão ao modelo teórico e metodológico de Dick (1990, p.31-34)[ix], referente aos hierotopônimos, proposto por Carvalho (2014)[x], em sua tese de doutorado, defendida no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Linguística, na UFMG. Resultado de um trabalho que se integra ao Projeto ATEMIG (Atlas Toponímico de Minas Gerais/Faculdade de Letras/UFMG), adota-se, nesta 2ª edição, a classificação proposta por Carvalho (2014), revista por Carvalho e Seabra (2018) para as denominações referentes a invocações à Virgem Maria, os mariotopônimos, que passam a constituir, ao lado dos hagiotopônimos[xi], uma subtaxe dos hierotopônimos. Para essas subtaxes utiliza-se “e” para indicar que integram uma taxe maior, como evidenciam os exemplos, a seguir: S. João (Hagiotopônimo e Hierotopônimo); N. S. da Oliveira (Mariotopônimo e Hierotopônimo).
4) A revisão da 1ª edição do Repositório resultou, também, em acréscimo de obras de referência para a 2ª edição, aqui apresentada, dentre essas, cita-se o Vocabulário de Africanismos, de autoria de Nelson de Senna,[xii] cujas informações apresentadas pelo estudioso, sobre o topônimo Bação, justificam a classificação do topônimo como cromotopônimo[xiii], por ser algo “embaciado”, ou seja, sem brilho, em alusão à cor do ouro.
Ao propor esta 2ª edição, espera-se mostrar os resultados de novas reflexões e de estudos sempre atentos a novas contribuições. Com certeza, há muito que acrescentar e rever e, para tanto, pronunciamentos e sugestões são sempre muito bem-vindos!
[i] Ecotopônimos: topônimos relativos às habitações de um modo geral.
[ii] Geomorfotopônimos: topônimos relativos às formas topográficas: elevações, depressões.
[iii] Animotopônimos: topônimos relativos à vida psíquica, à cultura espiritual, abrangendo a todos os produtos do psiquismo humano, cuja matéria prima fundamental não pertence à cultura física.
[iv] Hierotopônimos: topônimos relativos aos nomes sagrados de diferentes crenças.
[v] Fitotopônimos: topônimos de índole vegetal.
[vi] Corotopônimos: topônimos relativos aos nomes de cidades, países, estados, regiões e continentes.
[vii] Antropotopônimos: topônimos relativos aos nomes próprios.
[viii] BARBOSA, Waldemar de Almeida. Dicionário histórico-Geográfico de Minas Gerais. Belo Horizonte, Rio de Janeiro: Editora Itatiaia Limitada, 1995, p.354.
[ix] Tratam-se de 27 taxonomias, propostas pela estudiosa, que permitem classificar os topônimos de acordcom os principais fatores motivacionais DICK, Maria Vicentina de Paula do Amaral. Toponímia e Antroponímia no Brasil. Coletânea de Estudos. 2. ed. São Paulo: FFLCH/ USP, 1990.
[x] CARVALHO, Ana Paula Mendes Alves de. Hagiotoponímia em Minas Gerais. 2014. 822 f. Tese (Doutorado, Linguística Teórica e Descritiva) – Faculdade de Letras, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2014. Disponível em: < http://150.164.100.248/poslin/defesas/1480D.pdf>. Acesso em: out. 2019.
[xi] Hagiotopônimos: topônimos relativos aos santos e santas do hagiológico romano.
[xii] SENNA, Nelson de. Elucidário de africanismos: vocabulário de africanismos e afronegrismos usados no Brasil e na África colonial lusitana. Letra A-Z. Incompleto. Folhas avulsas. Manuscrito, recortes de jornais. 1938.
[xiii] Cromotopônimos: topônimos relativos à escala cromática